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11 de jan. de 2011

PARTE III

+A +/- -A
PAIXÃO & CRUELDADE



Edward PDV

Outro dia de aula, outro dia de tortura. As horas se arrastaram fazendo com que cada minuto parecesse um século.

Ao chegar à detenção, por algum motivo olhei para o lugar onde Bella costumava sentar. Fazia dois dias que ela não aparecia no Democracy. No primeiro dia achei que tinha abandonado o colégio, mas acabei perguntando ao Sr. Gray e ele me contou que ela estava doente. Provavelmente era uma desculpa para fugir do castigo.
Quando finalmente fui liberado, corri para o estacionamento, pois rajadas de vento anunciavam a tempestade que se formava com força total.

- Droga! Não acredito! - Chutei o pára-choque ao ver que tinham furado todos os pneus do Volvo.

Sem poder fazer nada, suspirei e joguei a mochila no banco de trás. Assim que bati a porta do carro, a tempestade começou a cair. Olhei para o céu e esperei que caísse também um raio na minha cabeça, mas como não tive sorte, decepcionado e ensopado, resolvi ir para casa a pé.

Segui por uma rua pouco movimentada e me distraí com meus próprios pés enquanto a chuva forte açoitava o meu rosto. Melancólico, evitava olhar para trás, pois sempre que fazia isso via claramente a pequena Isabella com seus cabelos cobrindo o rosto, seguindo-me por toda a parte. A essa altura me questionava se alguém estava colocando drogas em minha comida ou se atingira algum nível de demência. Preferia lidar com essas alternativas a ficar sendo atormentado por minha consciência. Confessar ao Filho da Democracia o que fiz foi como abrir uma caixa de pecados e não ter o poder de fechá-la. Constantemente me lembrava dos erros que cometi, das pessoas que magoei, e não tinha a menor ideia de como ser absolvido. Sabia que não era possível, mas queria muito, muito mesmo, ser perdoado por Isabella. Talvez assim eu encontrasse um pouco de paz.

De repente, ouvi uma música alta acompanhada pelo som da buzina de um carro. Olhei para trás e reconheci alguns alunos do Democracy.

- EI, BABACA! - Um deles jogou uma lata cheia de cerveja em mim e ela atingiu a minha testa.

O impacto foi tão grande que senti como se minha cabeça estivesse explodindo. Depois disso, tudo ficou escuro...

Bella PDV



O seguia já fazia um tempo, por isso vi quando foi atingindo por uma lata. Os caras que a jogaram fugiram assim que Edward desabou. Estacionei o Mustang a alguns metros dele e me aproximei lentamente. Quando o alcancei, fiquei parada observando a chuva espalhar pela calçada o sangue que brotava da testa do ex-Falcon. Com um sorriso o cutuquei com o pé e constatei que estava inconsciente, então coloquei uma perna de cada lado do seu corpo e me abaixei para encará-lo de perto.  

- É um fraco mesmo! - Balancei a cabeça decepcionada. - Você... não é... NADA! - Cuspi em sua face. Os olhos de Edward mexeram, mas ele não teve forças para abri-los. - Não é nem um desafio. - Revirei os olhos me levantando. Sem piedade, chutei suas costelas e desisti definitivamente do verme. - Cansei de você.

Dei-lhe as costas e fui para o Mustang, mas após alguns passos meus pés se tornaram pesados demais e não consegui me mover.

Isabella PDV

Foi difícil, mas recuperei um pouco da razão e olhei para trás. A imagem do homem caído, gravemente ferido, mexeu comigo. Fez-me lembrar do dia em que estive em uma situação parecida. Eu não era o tipo de pessoa que podia dizer: o sofrimento que passei não desejo nem pro meu pior inimigo. Porque, de fato, não só desejei como impus a Edward o mesmo tipo sofrimento. No início foi maravilhoso, só que com o tempo comecei a me sentir cada vez mais perdida. Enfeitar-me já não me fazia sentir-me bonita, o álcool já não me embriagava, o fracasso dos Falcons já não me causava euforia. Sentia como se estivesse desaparecendo... E ninguém sequer notava.

Exausta, fui até Edward e me ajoelhei junto ao seu corpo. Meu tolo coração me traiu mais uma vez, fazendo circular por todo o meu ser um sentimento que eu rejeitava com todas as forças. Chegava a ser ridículo sentir aquilo por alguém que só me causou dor. Edward nunca demonstrou um pingo de afeto por mim, no entanto, lá estava eu: Completamente dividida. Uma idiota carregando uma paixão que nem toda a razão do mundo era capaz de eliminar.

Às vezes me pergunto quando foi que caí nessa infeliz armadilha. O problema é que nunca consigo encontrar uma resposta coerente. Talvez tenha ficado obcecada, pois ele foi o único que me tocou quando eu era apenas uma “mancha”. Mesmo sabendo que foi com intenções imundas, eu me senti mais viva naquele dia do agora que tenho tudo que sempre quis. Ou talvez tudo no universo gere um oposto só para equilibrar, assim como preto e branco, verão e inverno, dia e noite, fogo e gelo... É possível que junto com o ódio tenha vindo também o amor. Infelizmente, esses dois sentimentos habitam em mim em quantidades tão grandes que, por vezes, me sufoco com seus excessos.

Suscetível às emoções, coloquei minha mão direita sobre o ferimento de Edward e ele gemeu muito baixo. Fixei bem meus olhos em seu lindo e marcado rosto, então as lembranças tomaram-me com veemência, provocando um amargo choro.

“Eu fui tão cruel e maldoso, fiz coisas com essa menina que não se faz nem a um animal.”

“Quando olho pra dentro de mim mesmo... só vejo uma pessoa muito, muito feia.”

“Por muito tempo tentei imaginar como ela se sentia, mas só recentemente compreendi o tamanho do sofrimento que afligi a alguém tão indefesa.”

Ver Edward entregue à sua punição não me trazia glória e satisfação, apenas me empurrava para o abismo onde o joguei. Finalmente estava percebendo que nessa história paga com orgulho e aflição não havia vencedores, ambos éramos perdedores. Será que tinha que ser assim? Duas almas transtornadas demais para seguir em frente?

Onde está a paz que vem com a justiça? Onde está a calmaria depois da tempestade? Por que ainda sinto tanta dor?

O pranto levou-me ao limite e desejei estar no lugar de Edward, ficar estendida lá, sem sentir nada. Ao ficar perdida nesse conflito, lembrei-me de uma frase que me serviu como bússola: perdoa-se na medida em que se ama.

Será que isso me faria dormir à noite? Me faria enxergar um caminho para percorrer? A pergunta mais difícil era: será que eu seria capaz de perdoar?

Observei as linhas faciais de Edward, os pequenos detalhes que faziam dele alguém singular. Então reuni tudo que ainda havia de bom no meu coração e permiti que o frio provocado pela tempestade aplacasse o fogo dentro de mim. Não era fácil, mas era necessário congelar o ódio para que, assim, eu pudesse sonhar com um pouco paz.

Mantive-me firme em minha decisão e aos poucos uma sensação diferente foi surgindo. Ela me fez ter a nítida impressão de que a água estava levando embora uma camada grossa de sujeira que se impregnara em mim. Talvez, só talvez, algo semelhante estivesse acontecendo com Edward, pois ele pronunciara meu nome. Embora não tenha ouvido sua voz, pude ler em seus lábios.

De olhos fechados coloquei minha boca junto à dele e sussurrei:

- Acabou. - Selei o difícil perdão com um beijo.

Sua respiração estava tão fraca que mal pude senti-la em meu rosto, porém seus lábios frios e proibidos me trouxeram um breve conforto.

Assim que afastei a minha boca, os olhos dele se abriram, mas não conseguiu mantê-los abertos por mais de um segundo. Preocupada com seu estado, não perdi mais tempo e liguei para a emergência. Fiquei com Edward até a ambulância chegar, depois o deixei ir embora tendo plena consciência de que já não podíamos partilhar o mesmo colégio. Nem sequer a mesma cidade.

Ao chegar em casa, fui para o banheiro e, com uma toalha, tirei o que sobrara da maquiagem. Encarei meu rosto limpo por algum tempo, em seguida, fui até o closet e arranquei de lá o velho uniforme do Democracy. Já não tinha motivos para voltar ao colégio, pois a vingança acabara e nada mais me restava. Eu não fazia a menor ideia do que ia fazer com a minha vida.


Frozen - Within Temptation

Eu não consigo sentir meus sentidos
Eu apenas sinto o frio
Todas as cores parecem desaparecer
Eu não consigo alcançar minh'alma
Eu pararia de correr, se eu soubesse que haveria uma chance
Me machuca ter que sacrificar tudo, mas eu sou forçada a desistir

Diga-me que estou congelada, mas o que eu posso fazer?
Não sei dizer as razões, eu fiz isso por você
Quando mentiras se transformaram em verdade, eu me sacrifiquei por você
Você diz que eu estou congelada, mas o que eu posso fazer?!

Eu posso sentir sua tristeza
Você não me perdoará,
Mas eu sei que você ficará bem
Me machuca que você nunca saiba, mas eu tenho que desistir

Diga-me que estou congelada, mas o que eu posso fazer?
Não sei dizer as razões, eu fiz isso por você
Quando mentiras se transformaram em verdade, eu me sacrifiquei por você
Você diz que eu estou congelada, mas o que eu posso fazer?!

Tudo irá embora
Destroços ficarão
Quando lembranças desaparecem no vazio
Apenas o tempo dirá
Se tudo foi em vão

Eu não consigo sentir meus sentidos
Eu apenas sinto o frio
Congelada...
Mas o que eu posso fazer?
Congelada...
Diga-me que estou congelada, mas o que eu posso fazer?
Não sei dizer as razões, eu fiz isso por você
Quando mentiras se transformaram em verdade, eu me sacrifiquei por você


(...)

- Alô? - Sonolenta, atendi o celular vendo que o relógio no criado mudo marcava 06:10h da manhã.

- Isabella, fui pego. - A voz de Jasper despertou-me.

- O quê?

- Os profissionais que a diretoria contratou finalmente rastrearam meu IP. Passei a noite inteira tentando despistá-los, mas não deu. A essa altura eles têm meu endereço, número de seguro social... Tudo!

- Espera! - Não conseguia raciocinar. - O que isso significa? Quando chegar ao colégio vai ser expulso?

- No mínimo. Talvez seja processado.

- Não! Não vá ao Democracy! Me dá um segundo pra pensar! Eu....

- Não adianta Isabella. Não quero que a diretoria chateie a minha mãe, prefiro ir lá me entregar.

- De jeito nenhum! Não se preocupe, eu vou assumir toda a culpa. - Nervosa, me levantei sem saber o que fazer.

- Se fosse possível... - Riu sem humor. - Foi o meu endereço que rastrearam, além disso, qualquer um saca que você não entende quase nada de informática.

- Jasper... - Minha voz vacilou quando fiquei presa ao pensamento de que ele ia perder a bolsa para a faculdade por minha causa. - Não se entregue, por favor.

- Não se preocupe. Eu conhecia os riscos e entrei nessa consciente. Até que estou um pouco conformado... - Suspirou. - Te vejo depois. - Desligou.

Feito uma imbecil inútil, fiquei olhando para o celular totalmente impotente. Demorei alguns minutos para assimilar o quanto a expulsão afetaria a vida de Jasper. Ele vivia com a mãe e não tinham dinheiro, então mesmo que terminasse o ano em um colégio público a expulsão ficaria em seu histórico permanente e ele nunca iria conseguir outra bolsa integral para Harvard.

- O que eu fiz? - Coloquei a mão na testa, incapaz de aceitar que o meu passado ia destruir o futuro de alguém tão importante pra mim. - Não... - Murmurei com o peito doendo de culpa.

Precisava fazer alguma coisa. Qualquer coisa...

(...)

Edward PDV

Mesmo com a cabeça doendo e a testa cheia de pontos, vesti meu uniforme. Era melhor enfrentar outro dia maçante de aula a ter que ficar em casa e lidar com meus pais. Eles esperavam que eu voltasse a ser o mesmo Edward, só que eu simplesmente não podia, porque tudo que já almejei agora parecia fútil e descartável. Antes queria ser respeitado, agora só queria ser esquecido, principalmente pelos Falcons. Antes queria ser um líder, agora só queria um pouco de paz. Tive uma vontade enorme de largar tudo e ir velejar sozinho, mas infelizmente não podia fugir.

Há semanas não conseguia reconhecer o homem que eu via toda manhã no espelho do banheiro. Há muito minha aparência externa se igualara à interior, no entanto me sentia pronto para aceitar que o cara com a barba por fazer, cabelos bagunçados e o rosto cheio de hematomas era realmente eu. O engraçado é que fisicamente estava um caco, mas por dentro não me sentia tão torturado como nos outros dias.

Meio tonto por causa da medicação, deitei-me na cama e tentei mais uma vez recordar os detalhes do incidente que me levou ao hospital. Por mais que me esforçasse, só me lembrava do momento em que fui atingindo, o resto se tornou um completo mistério. Não sabia quem tinha me socorrido, nem o que aconteceu nesse meio tempo.

Embora me faltassem lembranças reais, conseguia lembrar com clareza os sonhos estranhos que tive. Todas as minhas preocupações se manifestaram e meu inconsciente me fez voltar ao passado. Revivi vários momentos desagradáveis e Isabella me assombrou por um tempo que pareceu infinito. O curioso é que em certo momento me senti... consolado. Foi como se alguém me protegesse, como se um anjo soprasse em minhas feridas internas aliviando as dores. Ou eu estava ficando muito louco, ou ouvira esse anjo me falar “acabou”.

Seria mais fácil acreditar que os sonhos foram provocados pela pancada ou pela medicação, mas eu realmente queria acreditar naquele anjo.

Isabella PDV

Com o rosto inchado, bati na porta da casa da única pessoa que eu julgava ser capaz de me ajudar. Um empregado atendeu e logo foi me anunciar.

De cabeça baixa esperei impaciente próximo à soleira. O tempo corria contra mim, mas ainda tinha esperanças de consertar meu erro antes que o Democracy abrisse os portões.

Quando senti o perfume de Edward, ergui a cabeça e o encarei. Ele me fitou por dois segundos, depois bateu a porta na minha cara. Toquei novamente a campainha, pois desistir não era uma opção.

- Vai embora! - Falou friamente ao abrir a porta.

- Preciso...

- Me esquece! - Com desprezo tentou fechar novamente a porta e o impedi.

- Por favor. - Murmurei me esforçando para continuar ali.

- O que mais ainda pode querer de mim? - Se irritou.

Olhei para baixo e, com a face coberta pela vergonha, pronunciei as palavras que arrancaram o meu orgulho.

- Preciso da sua ajuda. - O encarei e Edward não acreditou no tamanho da minha ousadia. Nem eu mesma estava acreditando. Aquilo era o tipo de ironia pela qual ninguém deseja passar.

- Saia. Da minha. Frente. - Fechou-se em ódio.

- Me ajude a salvar o Filho da Democracia... - Engoli em seco. - Em troca me entrego à diretoria e assumo toda a culpa pelo vídeo.

Minha proposta pegou Edward de surpresa e por alguns segundos ele não soube o que responder.

- Não acredito em nada que saia da sua boca. - Pegou-me pelo braço e de forma rude foi me conduzindo até a calçada.

Preocupada com o tempo, tive que reagir e agarrar a única oportunidade.

- Edward, por favor, me escute!

- Cala a boca!

- O Filho da Democracia é o Jasper.

- Quem? - Parou.

- O cara do clube de informática que os Falcons maltratavam. Nós dois somos os Filhos da Democracia.

Relutante, ele não teve como não acreditar, pois rapidamente foi encaixando as peças do quebra-cabeça.

- Isso não é mais problema meu. - Largou-me na calçada.

- Ele não pode ser expulso... - Não permiti que fosse embora lhe segurando pela blusa. - Peça a seu pai para intervir. - Sabia que as chances disso acontecer eram mínimas, só que eu não me perdoaria se não tentasse de tudo.

- Você tem problemas mentais? - Ironizou. - Some da minha vida, garota!

Deu-me as costas e eu perdi o controle.

- Por que você tem que ser sempre tão detestável? - Gritei. - Por que não pode se preocupar com outra pessoa pelo menos uma vez? - Ele não me deu ouvidos e seguiu seu caminho. Magoada, fechei os olhos. - É claro que não pode... - Lamentei amargurada - Você é Edward Cullen.

Quando abri os olhos ele já estava vindo em minha direção e sua postura agressiva fez-me dar um passo atrás.

- Vocês acabaram com a minha vida e agora você vem me dizer que eu é que sou detestável? O que te fez imaginar que eu poderia mover uma palha sequer pra salvá-los? Quero que os dois se danem!

- Será que não entende? - O empurrei, irada. - O Filho da Democracia foi a melhor coisa que já aconteceu ao Democracy! Eu e você não valemos nada, mas Jasper é diferente! Ele deu aos alunos a chance de serem ouvidos... - Minha voz se tornou branda por causa do choro preso na garganta. - Ele fez mais pelos estudantes do que qualquer presidente do grêmio já fez. O cara não precisou ser popular, não precisou do apoio da diretoria... - Arfei. - Ele só precisou de uma oportunidade... E eu dei isso a ele. Então, que me expulsem! Que me processem! Mas não deixe que toquem no futuro de Jasper. A bolsa integral é a única chance dele de ir para Harvard.

- O colégio não é meu.

Fixei meus olhos nos de Edward e murmurei:

- Eu faço qualquer coisa... Nunca mais terá que olhar pra mim... Eu imploro. - Por Jasper e pela culpa, me humilhei. - Eu sei que me odeia, mas... - Continuar se tornou um desafio quase insuperável. - Só tente. Edward, por favor, tente. - Havia uma rendição em minha voz que pareceu confundir Edward. - Tente... Mais uma vez eu imploro!

Edward PDV

Ver Bella implorar era algo quase surreal. Nada tinha me preparado para aquele tipo de situação. Não sabia se diante de mim estava uma completa maluca ou se ela era apenas alguém desesperada. Vi ali a chance de me vingar por todos os males que me causara, mas não consegui reagir, pois aquela garota nada lembrava a Bella que me assediava. Na verdade, sua voz, suas expressões e até a forma com se movia eram completamente diferentes.

- Quem é você? - Indaguei confuso.

- Ninguém. - A pergunta pareceu lhe ferir. - Se seu pai conseguiu nos livrar da expulsão, talvez consiga fazer algo por Jasper. Prometo que confessarei a todos que armei pra você, depois disso, com um pouco de sorte, terá sua vida “perfeita” de volta. - Deu um meio sorriso forçado e foi embora.

Era tolice me importar com o destino do Filho da Democracia, mas as palavras de Bella possuíam um peso de verdade que nem o nosso passado era capaz de contestar. 

Isabella PDV

40 minutos atrasada, larguei o Mustang no meio do estacionamento do Democracy e corri para entrada do prédio. Focada em me entregar junto com Jasper demorei a perceber que não era a única correndo. Edward e eu quase nos chocamos ao alcançarmos as portas ao mesmo tempo, nenhum de nós parou e seguimos para a sala do diretor. Quando chegamos ao corredor principal, havia uma multidão apinhada no local.

Desolada, percebi que era tarde demais, pois todos já estavam falando de Jasper Whitlock. Os professores insistiam para que os alunos voltassem para as salas, mas até eles estavam curiosos. Aturdida, ouvi suposições sobre o que aconteceria com meu amigo e isso me atingiu de tal forma que saí empurrando as pessoas que estavam na minha frente. Infelizmente, nem com todo o esforço consegui me aproximar o suficiente. De repente, a porta da diretoria se abriu e de lá saíram o Sr. Weber e dois funcionários escoltando Jasper.

O diretor fez com que a multidão abrisse caminho e Jasper foi conduzido como se fosse um delinqüente perigoso. Enojada, percebi que a diretoria estava usando ele como exemplo a fim de reprimir qualquer tipo de manifestação contra a instituição.

Os alunos observavam em silêncio, provavelmente chocados com o fato de que a pessoa que admiravam era justamente alguém a quem ninguém nunca deu importância. Continuei tentando me aproximar de Jasper, mas a multidão se tornou uma barreira impenetrável. Aflita por não alcançá-lo, me preparei para gritar e assumir minhas culpas, só que antes que as palavras chegassem à minha boca um aplauso solitário foi ouvido. O ato incomum chamou a atenção de todos e precisei ficar na ponta dos pés para notar que vinha de Edward.

Ele continuou aplaudindo, não por satisfação, mas por admiração, fazendo com que os alunos se lembrassem de como tudo aquilo começou. A atmosfera foi se transformando conforme emergiam de nossa memória todos os feitos dos Filhos da Democracia. As denuncias, os ideais e verdades que foram entregues aos jovens de uma forma não convencional marcaram muitos ali, inclusive Edward e eu.

Os aplausos surgiram de todos os lados e em questão de segundos o som ultrapassou a voz autoritária do diretor. Os alunos de todas as idades e grupos sentiam uma imensa gratidão, pois o filho da democracia mudou a instituição de uma forma única e permanente.

Para driblar o alvoroço, o diretor obrigou Jasper a continuar andando, só que ao chegar ao final do corredor ele olhou para trás e finalmente me avistou. Ele não estava abatido, muito pelo contrário, seu sorriso me fez entender que criar Os Filhos da Democracia foi algo especial demais para nos arrependermos. Jasper arriscou tudo em nome de um ideal e por isso se tornara mais digno de respeito do que qualquer Falcon jamais fora. Ele, que sempre foi considerado um nerd cujo nome ninguém sabia, agora estava saindo do Democracy como um herói e o nome Jasper Whitlock seria para sempre lembrado naquela instituição. 

(...)

Mesmo depois que Jasper saiu do prédio os aplausos continuaram. Demorou bastante para a multidão se dispersar e eu fui a única a continuar no local.  Exausta, me encostei nos armários e deslizei até cair sentada.

Ainda não tinha conseguido absorver os acontecimentos e, mesmo que meu amigo não estivesse abalado, eu estava. Com os pensamentos embaralhados, tentei contabilizar quanto conseguiria pela venda de meus pertences, o problema era que o valor nunca seria suficiente para pagar uma faculdade como Harvard.

- Aqui está.

Surpresa, olhei para cima e não entendi por que Edward estava me estendendo um cartão de visitas.

- O que... - Balancei a cabeça, demasiadamente confusa.

- Jasper só tem que ligar para esse número. Ele estudará no colégio Buckley e a bolsa para Harvard já está garantida. O histórico dele ficará sujo por alguns meses, mas quando a poeira baixar voltará a ser como era antes.

Pasma, peguei o cartão sem saber o que dizer. Saí da casa de Edward convicta de que ele nada faria, por isso, por mais que eu quisesse reagir, não conseguia.

Ele não esperou que eu agradecesse e saiu como se nada tivesse acontecido.

- Foi difícil? - Perguntei em voz alta.

- Você não faz ideia. - Respondeu sem olhar para trás.

Era pra eu ter dito algo como “obrigada” ou “vou cumprir minha parte”, só que a curiosidade foi muito maior. Desejava saber o que Edward disse ou prometeu ao seu pai para convencê-lo a nos ajudar.

(...)

No dia seguinte, me preparei para colocar os pés no Democracy pela última vez. Edward conseguiu ajudar Jasper, então agora era a minha vez de honrar o acordo e tirar dos ombros dele a culpa por ter destruído a imagem do colégio.

Consciente de que teria de ser forte, não expus meu corpo alterando o uniforme. Estava usando-o exatamente como as outras alunas. Também não coloquei nenhuma maquiagem e usei apenas uma tiara para manter meus cabelos longe do rosto.

Faltei às primeiras aulas e só apareci no Democracy no horário do almoço. Enquanto seguia pelo corredor em direção ao refeitório, não fui xingada, muito menos assediada, pois minha aparência já não gritava “vadia maluca”. Era possível que muitos nem tivessem me reconhecido.

O refeitório estava lotado como sempre. Achei que seria difícil localizar Edward, mas logo o avistei sentado sozinho na mesa que antes era ocupada por Jasper e por mim. O que o motivara a sentar ali?

Edward PDV

Sem apetite, fiquei matando tempo observando uma borboleta que pousara na janela a meio metro de mim. Ficar sentado sem fazer nada era algo relativamente novo para mim, pois minha vida sempre fora cheia de obrigações, principalmente nos últimos anos. Ser desligado de todas as atividades que antes eu priorizava deixou-me com tempo livre até para sentir falta de um amigo. Será que era assim que Isabella se sentia?

Ouvi o ranger da cadeira no piso e, de relance, olhei para a moça desavisada que se sentou à minha mesa. Só quando voltei a fitar a janela foi que meu cérebro processou a informação de que a moça era Bella. Surpreso, tirei meus óculos escuros e a encarei.

- Hã... - Ela tamborilou os dedos na mesa. - Oi.

Imediatamente olhei para os lados me perguntando o que ela estaria armando agora.

- O que está fazendo? - Indaguei confuso.

- Como assim?

- Porque está vestida desse jeito? - Devia existir um bom motivo para ela abandonar o visual vulgar e aparecer no colégio tão... bonita.

- Estou vestida como todo mundo.

- E é isso que está me assustando.

- Não faz sentido. - Quase riu.

- O pior é que faz. - Estreitei os olhos.

Bella respirou fundo e, com uma expressão indecifrável, falou:

- Estou pronta para assumir a culpa pelo vídeo.

- É mesmo? - Revirei os olhos. - O que vai dizer? Que fez isso só para aparecer às minhas custas? Que queria ser o centro das atenções? Que ferrar com a minha vida foi o seu desafio do ano? Sinceramente... - Recoloquei os óculos. - Não quero mais mexer nesse assunto. Talvez com os novos escândalos os alunos se esqueçam de mim.

- É serio? - Pareceu-me chocada.

- Sim. Mas você ainda me deve um favor.

- O que... quer? - Mal conseguiu perguntar.

- Me dê sua mão.

- Não. - Estranhamente nervosa, escondeu as mãos como se eu fosse arrancá-las.

- Me dê sua mão. - Pedi novamente tirando do bolso do blazer uma caneta. - Não se preocupe, por mais que eu queira, não vou feri-la.

Relutante, Bella colocou lentamente a mão direita em cima da mesa. Eu a peguei e virei sua palma para cima, em seguida limpei com meus dedos o suor frio que estava deixando sua pele úmida demais. Não pude deixar de questionar seu súbito nervosismo.

- O que vai fazer?

Não respondi, apenas escrevi o nome “Isabella” em sua mão. A garota estremeceu como se a caneta tivesse lhe passado algum tipo de corrente elétrica.

- Peça a Jasper para entrar no sistema do colégio uma última vez. Quero a ficha de todas as garotas com esse nome que passaram pelo Democracy nos últimos 10 anos. - Bella tentou puxar a mão e não permiti. - Dessa vez, nada de trapaças ou dou um jeito de cancelarem as bolsas do seu amigo. - Larguei sua palma.

- O que pretende? - Murmurou.

- Não é da sua conta.

Isabella PDV

- Não é da minha conta. - Assenti tentando não soar sarcástica.

Fechei a mão e levantei ainda com as pernas trêmulas. Quando Edward escreveu meu nome, achei que ele tinha descoberto tudo. Cheguei a acreditar que, depois de tudo que aconteceu, estava preparada para aquele momento. Como me enganei... Todos os traumas quase me fizeram entrar em colapso da última vez que Edward revirou o nosso passado. Definitivamente, eu não sabia como reagiria quando colocássemos todas as cartas na mesa. Não queria ser covarde, mas necessitava de tempo pra reunir forças e lidar com todos os possíveis desfechos.

- Falarei com Jasper. - Saí sem olhar para trás.

(...)

Fiquei um bom tempo escondida na arquibancada do ginásio. Nesse meio tempo, conversei com Jasper pelo celular e ele concordou em arranjar a minha ficha. Só quando o sinal tocou foi que decidi procurar o Cullen.

Tentei achá-lo em meio à multidão que abandonava as salas, mas só quando os corredores ficaram quase vazios foi que o avistei entrando no banheiro masculino. Disposta a esperar, encostei-me a um canto e foi nesse exato momento que três dos Falcons apareceram. Eles entraram no banheiro e eu já sabia que buscavam por seu ex-companheiro de time.

Cruzei os braços e tentei ficar indiferente. O problema é que Edward já estava machucado, então os idiotas não precisavam extrapolar na brutalidade.

Edward PDV

Não havia a menor chance de escapar. O novo armador do time se colocou atrás de mim, prendendo o meu pescoço com o braço. Já o irmão mais novo de Mike, segurando com firmeza o meu punho, obrigou-me a colocar a mão sobre a pia. Então Tyler, que assumiu a posição de capitão, puxou um canivete do bolso.

- Isso não é necessário. - Mal consegui falar por causa da pressão feita em minha garganta.

- É assim que tratamos os traidores. - Tyler riu.

Ele cravou a ponta do canivete embaixo da unha do meu indicador. A dor intensa fez-me trincar os dentes e fechar os olhos. Torci para ele acabar logo com aquilo, porém não se apressou e forçou a unha para cima lentamente.

De repente, a porta do banheiro se abriu. Até pude reconhecer o som do extintor de incêndio, mas nem eu nem os Falcons conseguimos ver nada devido ao pó branco que se alastrou como uma densa fumaça. O cara atrás de mim se afastou e essa foi a minha deixa para fugir.

A fumaça já estava quase totalmente dispersa quando cheguei à porta. Infelizmente, não pude atravessá-la, pois Bella estava bloqueando a passagem segurando o extintor.

- Que lindo! - Tyler debochou em voz alta. - Salvo pela vadia. Isso não é muito honroso, Edward. - Eles riram e não olhei para trás.

- Vamos embora. - Disse para Bella.

- Eu prefiro ser uma vadia a ser um viadinho covarde. - A maluca revidou. Merda!

- Repete isso aí, sua vagabunda!

Um Falcon me puxou e Tyler ficou frente a frente com Bella.

- Chega de confusão, ok? - Falei em vão.

- Repetir? - A garota sorriu. - Não prefere que eu soletre? Além de viadinho covarde também é burro?

Assim que a garota se calou, Tyler deu-lhe um soco que a fez cair sentada.

Irritado e com a paciência esgotada, desvencilhei-me e, sem que ninguém esperasse, peguei o extintor e atingi o rosto de Tyler com violência. Ele imediatamente tombou com o nariz quebrado. Quando os outros Falcons ameaçaram reagir, ativei o extintor deixando-os momentaneamente perdidos.

Revoltado com tudo que fizeram comigo, perdi o controle e chutei a virilha do novo armador. Logo que se curvou tomado pela dor, o peguei pelos cabelos e com força bati duas vezes sua cabeça contra a pia. O irmão de Mike se acovardou e fugiu antes que eu chegasse até ele, então parti pra cima de Tyler, que tentava se erguer. O chutei no estômago e ele foi ao chão novamente.

- Se eu não bati nela, você também não pode. - Coloquei-me de joelhos em cima dos braços do Falcon.

- Foda-se! - Respondeu engasgando com o próprio sangue.

Desejando provocar nele o mesmo tipo de dor que vinham me afligindo, peguei o canivete do chão e enfiei em sua palma direita. O grito de pura agonia finalmente aplacou a minha ira, então me levantei e disse:

- Faz uma cesta agora, imbecil.

- O garoto foi buscar ajuda. - Bella puxou-me pelo braço. - Temos que sair daqui.

Isabella PDV

Edward fez corpo mole, mas consegui fazê-lo correr até o estacionamento. Ainda nervosa, entrei no Mustang e falei:

- O que está esperando? Entra no carro!

- Não tem necessidade.

- Como assim? Você feriu seriamente dois caras. - Meu coração estava a mil.

- Dificilmente os Falcons vão revidar. Eles não podem se arriscar porque tem jogo nesse final de semana, além disso, enfiei um canivete na mão do líder deles, isso só pode significar que me transformei em um deliquente perigoso.

Até que fazia um pouco de sentido.

- Mas isso vai chegar aos ouvidos da diretoria.

- Olha para mim... - Indicou seus hematomas. - Eles não vão querer explicar isso. Além do mais... - Passou a mão pelos cabelos, relaxando. - O que acontece com os Falcons, permanece com os Falcons. - Citou o lema do grupo.

Ficamos em silêncio até que coloquei a mão na boca gemendo por causa do ferimento.

- Por que me ajudou? - Havia mais do que curiosidade em sua voz.

- Pelo mesmo motivo que finalmente reagiu... - O encarei. - Tudo tem um limite.

Minha resposta o fez baixar a cabeça, pensativo. Ele nunca ia saber, mas provoquei Tyler de propósito. Queria que Edward parasse de aceitar a dor em nome da culpa e retomasse o controle de sua vida.

- Seu lábio vai inchar. - Desconversou.

- Posso conviver com isso.

- Vamos comprar gelo. - Limpou o dedo ensangüentado na camisa.

- Sinto muito por sua unha.

- Machucou só um pouco. Posso conviver com isso. - Repetiu o que eu disse.

- E a detenção?

- O que vão fazer? Nos expulsar? - Ironizou, finalmente entrando no Mustang.

(...)

Passamos em uma farmácia, depois seguimos para uma loja de conveniência. No estacionamento da loja, sentei-me no capô do carro e coloquei um pouco do gelo, que estava embrulhado em saco, no canto da boca. Sem aceitar a minha ajuda, Edward enrolou gaze em torno do dedo e tomou uma aspirina. Ele tinha curativos na testa e nas mãos, por isso me perguntei como ainda conseguia ter ânimo para ir às aulas.

- Às vezes parece que está mais morto do que vivo. - Comentei baixinho.

- Talvez esteja. - Encostou-se no carro.

- Eu sei como é. - Olhei para cima.

- É difícil acreditar, Anabella.

- O quê? - O fitei confusa.

- Não gosta de ser chamada assim? Foi o que ouvi pelo Democracy.

Bastante surpresa, tive que me esforçar pra responder.

- Claro... - Desviei o olhar. - Tem razão, só é... estranho me chamar assim. - Me encolhi.

- Falou com Jasper?

- Sim. Ele irá fazer o que pediu, mas vai demorar alguns dias porque, depois do vídeo, mudaram as senhas e os programas de segurança.

- Que seja... - Bufou colocando a mão na testa machucada. - Vou para casa.

- Ok. - Desci do carro.

- Não. - Afastou-se. - É a algumas quadras daqui, eu vou andando.

- Mas posso te dar uma carona.

- Dispenso. - Disse ainda ressentido.

Não insisti e Edward foi embora. Ele certamente nunca ia esquecer o que lhe fiz, assim como eu nunca esqueceria o que me fez, mesmo o tendo perdoado.

(...)

Meu final de semana foi uma droga. Não pude ver Jasper, pois ele foi visitar o tio a pedido de sua mãe. Entendia a preocupação da família de meu amigo, afinal, ninguém esperava que ele fosse ser expulso do colégio.

No tempo que tive livre, pesquisei sobre colégios fora do país. Austrália me pareceu um bom lugar para recomeçar, no entanto ainda estava presa ao Democracy por causa do acordo que fechei com Edward. O tempo que Jasper pediu para conseguir entrar no sistema do colégio me serviu como desculpa para me preparar para o momento decisivo: Para o ponto final de minha história com Edward.

O prazo de uma semana foi estipulado. Agora era só torcer por um pouco de sorte.
                                                   

* SEGUNDA-FEIRA *


Abri meu armário para pegar os livros que usaria na próxima aula. Perto de mim, um grupinho de rapazes ria vendo no celular o vídeo constrangedor que gravei. Eu já tinha passado por aquilo antes, mas me sentia diferente desde que perdoei Edward. Era como se eu estivesse mais vulnerável por não estar mais usando o ódio como dispositivo de autodefesa.

Às vezes sentia falta de Bella, porque sempre que ela se manifestava eu virava uma mera expectadora e não tinha que lidar com certas coisas. Estava sendo esquisito não senti-la fervendo dentro de mim. Talvez ficara perdida no deserto de gelo que se formou em meu peito.

- Ei, eu estava pensando... - Um dos rapazes se aproximou e tocou meu cabelo. - Vamos dar uma voltinha no meu carro. - Olhou para trás e seus amigos riram.

- Não. - Procurei ficar indiferente.

- Está se fazendo de difícil por quê? - Debochou.

O sinal tocou, fechei o armário e tentei me mandar.

- Eu sei do que gosta. - Agarrou meu pulso.

- Solta. - Falei com firmeza.

Os amigos do idiota ficaram rindo enquanto faziam gestos obscenos para mim.

- Juro que vai gostar. - Apertou minha bunda.

Irritada, consegui me desvencilhar e rosnei:

- Seu filho da...

- Foi mal. - Riu afastando-se. - Sério, foi mal mesmo.

Os caras baixaram a cabeça parecendo ameaçados. Eles foram embora tão rápido que o imbecil que me apalpou teve que correr para alcançá-los.

- Hã? - Franzi o cenho, muito confusa.

Não tive nem tempo de xingá-los e fugiram como se eu tivesse apontado um revólver para suas cabeças? Realmente esquisito!

Aliviada, dei de ombros e resolvi ir para a sala. Ao me virar, me choquei acidentalmente com Edward. O susto foi tão grande que sobressaltei com a mão no peito. Ele permaneceu quieto, com uma carranca que meteu medo até em mim.

- Você... - Me faltou palavras.

- Está tudo bem?

- Sim... Eu acho. - Cocei a nuca. - Por que eles se assustaram?

- Parece que agora sou considerado perigoso. Por sorte, os Falcons não confirmaram o incidente, mas você sabe que aqui os boatos se tornam fatos em um piscar de olhos.

- Obri...gada? - Não sabia se era aquilo que devia falar.

 - Se aqueles sujeitos voltarem a te incomodar, me avise.

- Por quê? - Embasbaquei.

- Não quero te dever um favor. - Manteve sua postura fria.

- Ah... - Finalmente entendi. - Não se preocupe, tenho tudo sob controle.

- Não foi o que pareceu. - Virou-se e foi embora.

Edward PDV

Fiquei remexendo meu almoço sem apetite. Já estava me acostumando a sentar sozinho na última mesa. Na verdade, era melhor do que ficar rodeado por falsos amigos.

No momento em que dei um gole no refrigerante, Bella, com sua enorme cara-de-pau, sentou-se na mesa com uma bandeja.

- Quem te convidou? - Quase me engasguei.

- Eu. - Respondeu com simplicidade.

- Não pode sentar aqui.

- Não tem outro lugar. - Começou a comer. - Além disso, já sentava aqui antes.

- Como pode agir assim? Ainda lembra que destruiu a minha vida, certo? - Franziu o cenho na dúvida, afinal, a garota era totalmente pirada.

- Me passa o catchup. - Agiu como se nem tivesse me ouvido.

- Não. - Afastei o frasco na esperança de que ela caísse na real.

- Vai monopolizar o catchup?

Respirei fundo.

- Vou deixar uma coisa bem clara: Você me ferrou completamente e, mesmo tendo me ajudado no outro dia, não significa que somos colegas. Somos como água e óleo, não nos misturamos.

- Hum... - Mastigou com vontade. - E eu sou a água ou sou o óleo?

- Que diferença isso faz?! - Esbravejei.  Qualé! Ela queria me tirar do sério?

- Só queria saber. - Deu de ombros.

- Pode ficar aí, mas me faz um favor... - Tentei não perder o controle. - Fica na sua, que eu fico na minha.

- Tudo bem. - Respondeu com nariz empinado. - Não vai nem notar minha presença.

- Ótimo. - Afastei minha cadeira e dei uma mordida no meu sanduíche.

Bella ficou quieta por uns 20 segundos, depois começou a bater o gargalo da garrafa de suco na quina da mesa tentando abrir a tampa.

Oh, Deus...

Suspirei.

Calma, Edward! Conte de 1 a 10, acalme-se e a ignore. 1, 2, 3...

Continuou fazendo barulho. 

4, 5, 6... Droga!

Impaciente, tomei-lhe a garrafa e me livrei da tampa. Coloquei o suco diante dela e Bella ficou olhando para a garrafa se esforçando para não rir.

- Não fale nada. - Resmunguei.

- Não vou. - Imediatamente se tocou de que fez exatamente o que pedi para não fazer. - Opa...

A encarei irritadíssimo.

(...)

Era a primeira vez que eu chegava à detenção sem nenhum machucado novo. A reputação de “perigoso” realmente veio a calhar. Já não estava achando tão ruim ficar preso ali, geralmente era silencioso e eu conseguia ficar longe das lamentações do meu pai.

O Sr. Gray sempre começava a ler um livro e acabava cochilando. Era como ficar sozinho, pois Bella e eu nos ignorávamos. No entanto, depois do incidente no banheiro, ficou um pouco mais difícil fingir que ela não estava presente. Mesmo com a garota sentada do outro lado da sala, ainda podia ouvi-la cantarolar baixinho uma canção que não reconheci. Bella girava uma caneta em cima do caderno, aparentemente perdida em seus próprios pensamentos.

Isabella PDV

“Você consegue imaginar um momento em que a verdade correu livre? O nascimento de todos nós e a morte de um sonho. Mais perto do limite...” - A música do 30 Seconds To Mars não saía da minha cabeça e era impossível não cantá-la baixinho.

Girava a caneta em cima do caderno fingindo que o tempo estava voando, mas a verdade é que em meu íntimo almejava que o tempo simplesmente parasse. Seria difícil não ver Edward todos os dias.

Será que morando em outro país vou conseguir superá-lo? Talvez...

Edward PDV

Com mais nada para fazer, fiquei observando Bella. Antes não me interessei em saber quem ela realmente era, pois já tinha formulado uma idéia sobre seu caráter. Eu a considerava descerebrada, ninfomaníaca e narcisista. O estranho é que, depois de vê-la implorar ajuda por causa de um amigo, essa imagem foi gravemente abalada. Era impossível não notar que Bella já não andava por aí se exibindo, assim como também não se envolveu com mais nenhum aluno... Aparentemente.

Por que fica tão quieta? Onde está todo aquele fogo que me fez perder a cabeça?


* TERÇA-FEIRA *


Como já era de costume, o Sr.Gray dormiu e Bella ficou do outro lado da sala rabiscando o caderno. Por estar mais entediado do que nos outros dias, apoiei os pés na carteira da frente e fechei os olhos. Minutos depois, minha cabeça foi atingida por algo leve. Ao abrir os olhos, vi uma bola de papel em cima da carteira. Intrigado, abri o papel e li em silêncio:

Estimado não-colega...

Não precisa dizer que arruinei a sua vida e blá blá blá... A questão não é essa. A questão é que estamos na detenção há mais de um mês. Está cada dia mais difícil suportar essa chatice, então venho, através desta, lhe propor um tratado temporário de paz. Não precisamos ser amigos, mas podíamos ser aliados na luta contra o tédio. Hoje, enquanto estivermos dentro dessa sala, podíamos pelo menos conversar um pouco. Não se preocupe, quando sairmos daqui você pode continuar agindo como se fosse me dar um tiro. Topa?

Ergui a cabeça e encarei Bella absolutamente surpreso.

Isabella PDV

Edward ficou pensativo por alguns minutos e, pela cara de poucos amigos, pretendia me mandar pastar. Quando começou a escrever no mesmo papel que lhe joguei, meu estômago revirou, já prevendo o festival de xingamentos que vinha pela frente. Ele lançou a bola de papel de volta e imediatamente a abri.

Nada estimada não-colega...

Só há um jeito de isso funcionar. Dentro dessas quatro paredes, devemos nos tratar de uma forma diferente, do contrário, acabaremos em ataques mútuos. Finja que tem um amigo que não vê há uns 10 anos e escreva uma carta para Anthony, que, no caso, sou eu. Então responderei a carta, mas não para Bella, e sim para Anabella. Concorda?

Ergui a mão e fiz sinal de positivo. Não dava para fingir que éramos dois estranhos que acabaram de se conhecer. Assim como também não era possível ficar frente a frente papeando como se não tivéssemos enlouquecido um ao outro. Por essas questões e mais, achei a ideia de Edward extremamente interessante. Animada com a possibilidade de falar com ele sem troca de farpas, comecei a escrever o que vinha na minha cabeça.

Edward PDV

Assim que Bella terminou de escrever, dobrou sua carta em forma de avião e lançou para mim. Levantei e a peguei no ar. Tentando disfarçar a curiosidade, abri a carta pigarreando.

Caro Anthony, como vai você?

Nossa, como o tempo voa... Já faz muitos anos que não nos falamos. Tantas coisas mudaram que eu nem seria capaz de fazer uma lista. Crescer não foi exatamente como eu esperava. Meu corpo passou por tantas mudanças que eu mesma mal consigo acreditar. Uma das coisas boas é que agora não sou mais uma tábua, rsrsrs. É, eu finalmente tenho seios!

Sem querer ri alto.

Esquece essa besteira que eu escrevi! Imagino que também tenha mudado bastante. Ter 18 anos não é uma loucura? Alguns dias desejamos abraçar o mundo, outros só queremos correr para longe das responsabilidades. Falando em responsabilidades... Como vão os estudos?

Aguardo resposta.

Atenciosamente...

Marie.

Estranhei Bella ter assinado como Marie, mas não questionei seus motivos e imediatamente comecei a escrever uma resposta.

Isabella PDV

Edward demorou apenas alguns minutos para ler e responder minha carta. Ele também a enviou em forma de aviãozinho, então a desdobrei e li com receio.

Marie...

Eu estou razoavelmente bem, obrigado. Crescer também não foi como eu esperava. Com 15 anos eu já me sentia um adulto. Acredito que não tive uma adolescência muito normal. Eu sempre quis seguir os passos do meu pai e acabei ficando obcecado com a idéia de ser presidente do grêmio estudantil do meu colégio. Acho que eu só era um idiota querendo impressioná-lo. Sei lá... Talvez eu tenha perdido muita coisa dessa fase porque, enquanto os outros garotos se divertiam com festas e paqueras, eu ficava em casa estudando e pensando em formas de incrementar meu currículo escolar. Droga! Eu nem sei por que estou escrevendo isso! Por favor, desconsidere.

Fiquei olhando para o papel sem saber o que pensar. Será que Edward estava tão louco para se abrir que estava fazendo aquilo justo comigo? Será que eu era a única pessoa disposta a ouvi-lo?

Acho bacana ter 18 anos. Dá para fazer muita coisa legalmente... Você sabe. O colégio é UMA DROGA! UMA DROGA! UMA DROGA! Minhas notas caíram muito, só que não estou ligando muito pra isso nesse momento. E você? Aposto que está prestes a ser reprovada. Nunca te achei com cara de estudiosa.

Atenciosamente...

Anthony.

P.S. Parabéns pelos seus seios.

Fiquei com tanta vergonha de seu “P.S” que joguei o cabelo para o lado e escondi o rosto morrendo de rir.

Edward PDV

Bella me enviou outra carta e eu a abri sem saber o que esperar.

Anthony, tudo bom?

Lamento decepcioná-lo, mas já tenho créditos suficientes para chegar à faculdade. Sou boa em todas as matérias, exceto economia doméstica. Não sei cozinhar, nem nada desse tipo. Assustador, né? 

Foi interessante ler sobre sua adolescência. Na verdade, é quase um alívio saber que não sou a única que detestou essa fase. Se eu pudesse, riscaria ela da minha vida. Eu também ficava em casa estudando, embora algumas vezes tenha desejado sair e “curtir” como as outras garotas. Eu não era, digamos, muito sociável, então nunca tinha um par para sair nos finais de semana. O ponto alto dos meus sábados era ler, pela milésima vez, “Hamlet” ou “O Conde de Monte Cristo”. Deprimente, eu sei...

Como assim? Não! Essa não podia ser a Bella! Será que estava me zoando?

Lamento pela questão com seu pai. Às vezes, realmente ficamos perdidos em propósitos que depois se tornam obsoletos. E agora? O que você quer ser?

Atenciosamente...

Marie.

Isabella PDV

Edward demorou um pouco mais para responder. Fiquei ainda mais nervosa, pois amassou a carta que ia me enviar e escreveu outra. Ao abrir o “aviãozinho” que jogou, pude finalmente ler:

Cara Marie...

Está brincando? Não consigo te imaginar estudando, muito menos esperando um convide para sair. Definitivamente, é difícil de acreditar! Inicialmente escrevi questionamentos sobre tudo isso... E alguns xingamentos também, mas depois percebi que “se passaram 10 anos” e isso é tempo demais para acreditar que ainda te conheço. Vou te confessar uma coisa: tem uma porção de gente que achei que conhecia bem e acabaram me decepcionando. Na real, eu não conheço ninguém, muito menos você. Se me diz que tudo isso é verdade, só me resta acreditar. Se for mentira, bem, acho que nem me importo.

Continuando... Como assim não sabe cozinhar? Não é tão complicado. Pode parecer estranho, mas até que sei me virar bem na cozinha. Não estou me gabando... Talvez, só um pouco.

Sorri só de imaginá-lo cozinhando.

Sabe, você me fez uma pergunta extremamente difícil. Eu tinha uma vida bem planejada e estruturada, só que agora não faço a menor idéia do que farei. Não quero me envolver com política, nem com administração... Enfim, talvez acabe nem indo para a faculdade pelo simples fato de não saber o que cursar. Qualquer pessoa me diria: faça algo de que gosta. O problema é que, no momento, não gosto de nada e não me interesso por nada. Eu devia estar desesperado por me sentir assim?

Aguardo resposta.

Atenciosamente...

Anthony.

No momento em que ia começar a escrever uma resposta, o alarme do relógio do Sr.Gary tocou nos avisando que era hora de ir embora. Juntei minhas coisas, me despedi do professor e passei pela porta junto com Edward. Não trocamos sequer um olhar.


* QUARTA-FEIRA *


Edward PDV

Bella e eu partilhamos as mesmas aulas e nos tratamos com a frieza de sempre. No horário do almoço, ela não veio sentar-se comigo. Achei o fato curioso, já que ela parecia adorar de me importunar. Gostei de ela ter entendido que não a queria por perto, mas também não precisava deixar de comer só para me evitar.

Quando a última aula acabou, segui para a detenção. Normalmente, eu enrolava um pouco e sempre chegava atrasado, mas dessa vez fui pontual só para descobrir se Bella tinha começado a debochar de mim pelas coisas idiotas e precipitadas que escrevi. Eu estava amargamente arrependido de ter caído em mais um de seus “joguinhos”.

- Boa tarde, Sr.Gray. - Sentei-me na carteira de sempre.

- Boa tarde, Edward.

Passaram-se 7 minutos e nem sinal da garota. Comecei a pensar um monte de bobagens relacionadas com o que escrevi. Não sabia se ainda existia algo em que ela pudesse me prejudicar, mas a dúvida me inquietou. Por fim, acabei temendo por sua segurança, questionando-me se os Falcons tinham lhe feito algum mal.

- Boa tarde, Sr.Gray. - Bella arrastou-se até sua carteira e senti-me levemente aliviado.

- Qual o motivo do atraso, senhorita?

- A verdade, senhor? - Franziu o cenho.

- É o que eu espero.

- Cochilei sem querer. - Sorriu aparentemente constrangida. - Desculpa.

- Que isso não se repita.

Quarenta minutos depois, o Sr.Gray dormiu. Terminei o exercício que passou e fiquei me fingindo de distraído, mas infelizmente estava era com a minha atenção voltada para a forma como Bella escrevia. Estaria respondendo a minha carta?

Claro que não, seu burro! O tratado não tem validade hoje.

Cerca de três minutos depois, Bella fechou o caderno e relaxou na cadeira. Foi meio frustrante confirmar que estava respondendo o exercício e não escrevendo para mim.

Tentei pensar em outras coisas. Muitas, muitas outras coisas, só que depois de uns 10 minutos acabei escrevendo um bilhete para a garota.

Isabella PDV

Fiquei espantada pelo fato de Edward jogar uma bola de papel em mim. Eu sabia que era um bilhete, mas não esperava que quisesse falar comigo. Peguei o bilhete que foi parar na carteira à minha frente e o li.

Marie...

Reparei que parou de me escrever e gostaria de saber se perdeu o interesse em manter contato.

Atenciosamente...

Anthony.

Fiz um esforço gigantesco para não sorrir. Edward queria continuar com a “brincadeira”? Por essa eu não esperava.

Empurrei o sono para longe e, imediatamente, comecei a lhe escrever uma carta.

Edward PDV

Outra vez dobrada em forma de avião, Bella me enviou uma carta.

Caro Anthony...

Não pense que me esqueci da pergunta que me fez na última carta; na verdade, passei a noite em claro pensando em tudo que escreveu.

Imediatamente me questionei se era verdade. O fato de ela ter cochilado no colégio confirmava sua alegação?

Não acho que deva se desesperar por não saber que rumo quer tomar na vida. Parece que todo mundo passa por isso em algum momento. Alguns se precipitam, e outros esperam que surja uma “luz” que os indique a direção certa. Eu realmente acredito que essa “luz” exista, e estou esperando por ela já faz um tempo. Ultimamente tenho acreditado que vou encontrá-la em outro país. Espero que você consiga achar a sua.

Você me falou que não se interessa por nada e eu não acreditaria se não estivesse passando pela mesma situação. Por favor, entenda que não é hipocrisia. Eu sei exatamente como se sente!

E pessoas? Tem alguém que pode te dar “O conselho certo”?

Atenciosamente...

Marie.

Suspirei, admirado com as palavras maduras e coerentes de Bella. Impulsionado pela forma sensível com que me respondeu, peguei a caneta e comecei escrever.

Isabella PDV

Edward parecia bastante concentrado enquanto escrevia. Às vezes olhava para o céu através da janela, possivelmente refletindo sobre o que escrevi. Quando me enviou a resposta, meu coração bateu um pouco mais forte de ansiedade.

Marie...

O que escreveu fez-me enxergar a situação sob uma perspectiva diferente. Obrigado. É possível que exista mesmo essa “luz”. Quando eu achá-la, quem sabe as coisas melhorem.

Como dei a entender antes, não tenho ninguém confiável no momento. Já tive um melhor amigo e um namorada, mas isso... Deixa pra lá! Quanto ao conselho, dispenso! Segui conselhos a minha vida inteira e agora tudo que quero é seguir a minha própria vontade, apesar de não saber ainda qual é. Foi estranho ler que sabe como me sinto. Tão estranho que nem sei o que dizer sobre isso.

E você? Em quem tem confiado? Quem são as pessoas importantes da sua vida?

Atenciosamente...

Anthony.

Era uma pergunta difícil e eu precisei pensar antes de responder.

Edward PDV

Bella demorou para responder e, quando a carta chegou às minhas mãos, a abri devagar só para não deixar transparecer minha extrema curiosidade.

Anthony...

Fora a minha família, só existem duas pessoas importantes pra mim. Uma delas é meu melhor amigo e a outra... É um rapaz com quem me envolvi quando era bem mais jovem. Eu não sou alguém fácil de lidar. No meu colégio, metade dos alunos me detesta e a outra metade só quer transar comigo. Tenho fases e facetas e isso torna tudo mais difícil. Nesse momento não me importo em ser uma “louca”, mas não quero ser odiada para sempre, entende? Eu só queria ser normal.

Fases e facetas? Isso definitivamente explicava algumas coisas. Sua nova fase incluía ser gentil comigo? Como é que Marie, quero dizer, Bella não queria ser odiada se ela só aprontava?

Isabella PDV

Edward escreveu uma resposta mais rápido do que eu esperava. Interessadíssima, comecei a ler:

Marie...

Explica pra mim o que é uma pessoa normal, porque, sinceramente, acho que não existe ninguém “normal”. Hoje em dia, os valores morais estão invertidos, então o que antes era considerado bem aceito hoje já é considerado ultrapassado ou inaceitável. Tentar se adaptar a essa sociedade é que é a verdadeira loucura. Não quero ficar passando sermão nem nada, mas tem que descobrir um modo de viver bem consigo mesma. Encontrar um equilíbrio interior fará com que se encaixe na vida. Sua ânsia em se sentir aceita deve estar te fazendo tomar decisões erradas. Pense nisso!

Petrifiquei olhando para o vazio. Algumas pessoas já tinham me aconselhado, mas Edward simplificou de tal forma que alcançou a minha alma. Por um segundo me senti exposta e confortada pela única pessoa que achei que jamais me entenderia.

Saindo lentamente do estado de letargia, voltei meus olhos para a carta.

Mudando de assunto... E esse rapaz? Não que seja da minha conta, mas o que aconteceu? Se o cara é tão importante, por que não está com ele?

Atenciosamente...

Anthony.

Passei a mão pelo cabelo sem saber como responder àquilo.

Edward PDV

Notei que Bella ficou levemente ruborizada enquanto escrevia. Ansioso para saber o conteúdo da carta, desdobrei-a sem rodeios.

Caro Anthony...

Obrigada pelas tocantes palavras. Pensarei sobre o que você disse. Quanto ao que indagou, bem... Minha história com esse rapaz é bastante complicada. Sempre nutri um sentimento muito forte por ele, algo inominável. Foi o primeiro a me tocar internamente e externamente, por isso meus laços com ele vão além do entendimento de muita gente.  Infelizmente, ou felizmente, o cara nunca gostou de mim. Não faço o tipo dele.

Imediatamente olhei para Bella. Como assim não fazia o tipo dele? Ela era tão bonita, principalmente quando estava sem a maquiagem escura e as roupas chamativas. Talvez ele não gostasse mesmo da personalidade peculiar dela. Naquele momento pareceu que eu jamais tinha transado com Bella. Foi uma sensação bem estranha, considerando o nosso passado.

Queria me interessar por outros rapazes, só que simplesmente não consigo. Não pense que fico me lamentando o tempo todo. Eu aceito que eu e ele não fomos feitos um para o outro.

Entendo que não quer falar sobre sua ex-namorada, mas como anda sua vida sentimental?

Atenciosamente...

Marie.

Isabella PDV

Me arrependi de ter escrito sobre meus sentimentos, então, quando a resposta de Edward chegou, não me preocupei em demonstrar indiferença.

Marie...

No momento não tenho vida sentimental; na verdade, eu nem tenho certeza se acredito nesse de lance de “amor”. Não me entenda mal, eu até queria acreditar, mas acho que atração é geralmente confundida com “amor” ou paixão. Nunca encontrei alguém que vivesse um “amor” desinteressado, entende? Assim como também nunca vi amarem um completo perdedor.

Inicialmente não soube o que pensar, mas acabei compreendendo o ponto de vista dele.

Os românticos acham que morrer por alguém é a maior prova de amor que possa existir, mas eu discordo totalmente. A maior prova de amor é justamente viver. Refiro-me a viver com a mesma pessoa por toda uma vida e ainda conseguir agir como um casal de adolescentes recém-apaixonados. Você conhece um casal assim? Porque eu não! Entende onde estou querendo chegar? Ainda não encontrei motivos para acreditar nesse sentimento.

Voltando a falar do cara que gosta... Não faz o tipo dele? Tem certeza que ele já sabe que seus seios cresceram?

Coloquei uma mão no rosto, envergonhada.

Atenciosamente...

Anthony.

Assim que terminei de ler, o alarme tocou nos liberando da detenção. Peguei minhas coisas normalmente e fui embora.

(...)

Sabendo que Jasper tinha chegado de viagem, me refugiei em sua casa e lhe pus a par dos últimos acontecimentos.

- Nossa... - Devolveu-me as cartas de Anthony quando terminou de ler. - O que pretende fazer?

- Nada. Como ele mesmo disse, somos como água e óleo.

- Não foi isso que pareceu aí nas cartas. Isabella, pode ser que...

- Não. - O interrompi, determinada. - Vou dar a Edward o que ele quer, depois vou passar um tempo na Austrália.

- Vou sentir sua falta. - Suspirou tocando minha mão. - Falando nisso... - Abriu a gaveta do criado mudo e tirou de lá um papel. - Fiquei um tempo em um cyber café e consegui imprimir a ficha que me pediu.

- Obrigada. - Estendi a mão para pegar e ele não me entregou.

- Você sabe que tem uma foto sua... - Procurou as palavras certas. - Antes da “mudança”? - Ficou preocupado.

- Eu sei. - Respondi melancólica.

Renovavam as fotos das fichas todos os anos e ainda não tinha tido a oportunidade de eliminar a única foto que mostrava o meu rosto deformado. Tirá-la foi uma tortura, mas na época não tive alternativa.

- Não prefere olhar antes?

- Não. - Baixei a cabeça, peguei o papel e o dobrei ao meio.

Eu sabia que se olhasse para a ficha perderia a coragem de entregá-la a Edward. Não queria mais hesitar, era chegado o momento de deixá-lo e nada mais.

(...)


* QUINTA-FEIRA *


Sozinha na madrugada, me entreguei às mãos da melancolia. Eu já tinha imprimido minha passagem para Sidney e, na manhã de Sexta-feira, pretendia abandonar de vez Edward e o Democracy. Meus pais não faziam idéia do meu plano, mas quando chegasse à Austrália lhes faria entender o quanto eu precisava ficar longe.

Minha coragem oscilou em vários momentos e, em alguns, pensei em continuar indo ao colégio só por causa do tempo que passava na detenção com Edward. O problema é que eu estava totalmente desacreditada. Nós nem éramos exatamente amigos e mesmo que fôssemos, continuaria presa a uma paixão platônica por um homem que nunca seria meu. Ficar o mais longe possível dele era a única coisa certa a fazer.

Ao andar pelos corredores do Democracy ignorei completamente as centenas de alunos e fui abençoada com a nítida impressão de que todos haviam sumido. Vaguei pela instituição como um fantasma preso em seu próprio tempo, no entanto, eu ainda podia vê-lo. Edward foi o único que conseguiu ultrapassar as barreiras que construí para suportar o último dia.

Edward PDV

Na sala de detenção, repeti três vezes a mesma frase da redação idiota que estava fazendo. Chateado, amassei a folha e fitei Bella. Não conseguia parar de me perguntar por que estava tão cabisbaixa. Sua fisionomia abatida encheu a minha cabeça de dúvidas, por isso não consegui esperar o Sr.Gray cochilar.

Escrevi um bilhete e o amassei em uma bola. Sabia que se o Sr.Gray me flagrasse fazendo aquilo pegaria no meu pé, então esperei que estivesse bem distraído com seu livro e inclinei um pouco a minha carteira na direção de Bella, para que assim a bola de papel caísse em cima de sua carteira. Equilibrando-me, joguei a bola e minha carteira virou.

Isabella PDV

Um estrondo fez-me sobressaltar. Assustada, vi Edward erguer-se do chão bastante constrangido.

- O que aconteceu, Cullen? - Indagou o professor.

- Nada, Sr.Gray, foi só... - Coçou a nuca. - A carteira. - A colocou de volta no lugar e sentou-se pondo uma mão no rosto.

Cobri minha face com o caderno e gargalhei o mais baixo possível. Até o professor riu do pequeno acidente de Edward. Só quando me acalmei foi que reparei que havia uma bola de papel no acento à minha frente. Curiosa, fingi me espreguiçar e debrucei-me sobre a carteira alcançando o bilhete. Imediatamente o abri sem saber o que esperar.

Marie, você está bem?

Não quero ser chato, mas estou curioso.

Anthony.

A estranha preocupação de Edward trouxe-me um pouco de conforto. Era bom saber que alguém se importava, porque sem Jasper no colégio me sentia ilhada.

Edward PDV

Quando Bella terminou de escrever, amassou a folha e se levantou. Ela foi até a lixeira, mas antes de jogar o papel lá dentro piscou o olho para mim. Para que o Sr.Gray não desconfiasse, esperei três minutos, depois, com o pretexto de me livrar de alguns papéis, fui buscar o bilhete. De volta ao meu lugar, disfarçadamente li:

Caro, Anthony...

Estou tendo um dia especialmente difícil, mas ficarei bem.  

Refleti sobre o que escreveu na última carta. Entendo o seu ponto de vista, porém te digo que já conheci o suficiente do amor e do ódio para lhe garantir que são um caminho sem volta. Uma vez que conhecemos esses sentimentos eles têm que seguir o seu curso... Nascem, crescem e morrem. O tempo de duração de cada uma dessas etapas é que varia. O que estou tentando dizer é que o amor é uma aposta sem garantias. Você só vai saber se ele realmente existe quando se permitir amar alguém sem esperar nada em troca.

Atenciosamente...

Marie.

Reli a carta três vezes. Queria me mostrar indiferente às palavras de Marie, mas elas faziam sentido demais para ignorá-las. Nunca me aproximei de uma garota de modo despretensioso. Tudo girava em torno do homem que eu deveria ser, então não eram escolhidas pelo que me faziam sentir, e sim pelo que podiam me oferecer.

Eu nunca tinha conversado sobre aquele assunto com ninguém; de fato, todas as cartas que troquei com Bella foram únicas. Era intrigante como vários assuntos importantes fluíam em nossas conversas, fazendo-me ver que ela era muito mais interessante e sensível do que pretensiosamente imaginei. Ainda assim, por causa de tudo que aprontou comigo, senti a necessidade de analisá-la mais a fundo. Não queria mais me decepcionar.

Isabella PDV

Quando Edward terminou de escrever, o professor já havia caído no sono, então ele dobrou a carta em forma de avião e lançou para mim.

Marie...

Você me surpreende todos os dias. Garanto que poucas pessoas são capazes disso. Você enxerga o amor sob uma ótica interessante, isso faz com que eu me envolva em suas palavras e reflita até sem querer. É por esse motivo e outros que te proponho um passo adiante. Já que faz “anos que não nos vemos”, sugiro um encontro.

Um encontro?

Acredito que seja o momento de deixarmos as cartas um pouco de lado e finalmente conversarmos cara a cara. Está disposta a me encontrar no final da sala? Se a resposta for sim, erga a mão direita.

Atenciosamente...

Anthony.

Engoli em seco, tensa demais para fitar Edward. Como assim um encontro? O que pretendia?

Quase entrei em pânico sem saber se estava pronta para encará-lo depois das cartas, pois me expus mais do que deveria. Então percebi o quão boba estava sendo. Era exatamente daquilo que eu precisava! Não podia ir embora e deixá-lo com uma imagem distorcida de mim. Queria que Edward realmente me enxergasse. Bastante decidida, ergui a mão como ele pedira e procurei me acalmar.

Edward PDV 

Quando Bella aceitou me encontrar, fiquei repentinamente nervoso. Não sabia como lidar com a ansiedade. No fundo eu estava com medo de estar sendo enganado e a garota não ser como demonstrava nas cartas.

Eu já nem sabia o que pensar sobre minhas atitudes. Era pra me manter o mais longe possível de Bella, o problema é que ela sempre me atraiu de uma forma irresistível. Primeiro fisicamente, agora intelectualmente.

Disposto a ir fundo em minha decisão e descobrir a verdade, ajeitei o nó da gravata, passei a mão pelos cabelos e me levantei. Fui para o final da sala sem olhar para Bella e me encostei na parede.

Isabella PDV

Quando Edward se levantou, achei que eu ia enfartar. Não fazia a menor idéia do que ia dizer a ele. Aquela ia ser a primeira vez que falávamos depois de dias apenas trocando cartas. Como cada carta rompeu uma barreira, nosso encontro estava destinado a ser extremamente pessoal e íntimo.

Pálida feito papel, apertei minhas bochechas tentando ganhar um pouco de cor e me arrependi de não ter passado sequer um batonzinho. Assim que me levantei, ajeite o uniforme, peguei meu caderno e caneta, respirei fundo e, a passos lentos, cheguei ao fundo da sala.

Ao encontrar Edward, o encarei com a cabeça bem erguida, mas infelizmente ele nada fez ou falou. Imediatamente a dúvida se manifestou e eu já não tinha certeza sobre o “pessoal e íntimo”. Sem muitas alternativas, me sentei no chão com as costas apoiadas na parede e comecei a desenhar no caderno.

Edward PDV

A garota não me deixou ver o que estava fazendo no caderno. Intrigado com sua ação, fiquei à espera de entender o que se passava.

Pouco tempo depois, Bella ergueu o caderno escondendo o rosto atrás dele, só aí pude ver o desenho bem mal feito de uma menina segurando uma bandeira com a palavra “paz”.

- Essa... é você? - Estreitei os olhos buscando entendê-la. Bella sorriu e virou a página mostrando-me outro desenho. Não precisei analisar muito para sacar que o menino com a expressão rabugenta era eu. - Ao menos estou bonito. - Quase ri dos garranchos. - Posso ficar com esse retrato tão... fiel?

- Sim. - Arrancou a folha e me entregou.

- Obrigado. - Guardei no bolso.

- Disponha.

O sorriso de Bella era tímido e gracioso. Em nada, nada mesmo, parecia o sorriso debochado e sarcástico de antes. Preso a esse mistério, sentei-me ao seu lado.

- Sentiu a minha falta? - Perguntei sem pensar.

- Como? - Fitou-me confusa.

- É que não nos vemos há 10 anos. Lembra-se? - Apressei-me em explicar.

- Ah... - Assentiu. - Você cresceu. - Entrou na brincadeira.

- Você também.

Lembrei-me da carta dela e, sem querer, olhei para os seus seios. Logo que Bella percebeu, desviei o olhar, ridiculamente desconcertado. Não era típico de mim ter esse tipo de reação.

Isabella PDV

Edward estava me deixando confusa. Ele parecia em cima do muro, indeciso sobre como deveria me tratar.

- O que está pensando? - Perguntei baixinho.

Ele respirou fundo antes de responder.

- Tudo que escreveu nas cartas é verdade? - Virou-se para mim.

Sua pergunta me pegou de surpresa, mas eu estava cansada de fugir e de mentir. Desejava mais que tudo ser eu mesma com ele.

- Sim, Edward. - Respondi com os olhos fixos nos dele. - Só porque eu fiz coisas chocantes no passado não significa que eu seja uma pessoa inteiramente má. Nem sempre o que fazemos define quem somos.

Pela expressão torturada dele, percebi que minhas palavras o tocaram profundamente, criando ligações com o que sentia a respeito de si mesmo.

- Você tem razão. - Murmurou certamente lembrando-se de quem foi.

- Se pudesse escolher, em que local teria marcado esse encontro?

Ele imediatamente olhou para o teto, refletindo.

- Já esteve no píer de Santa Mônica?

- Não.

- É enorme! As águas durante a tarde são calmas e até dá para sentir o cheiro de pipoca vindo das carrocinhas. O ambiente é tão aconchegante que você nem se importa com as dezenas de pessoas à sua volta.

- Parece demais. - Sorri.

- Não vou lá há muito tempo. - Balançou a cabeça, lamentando. 

- E o que faria para me passar uma boa “primeira impressão”?

- Eu me exibiria com os meus... talentos? - Fez uma careta sem saber se tinha respondido certo.

- Que talentos? - Ri sem querer.

- Muito obrigado. - Fingiu-se de ofendido. - Para o seu governo, eu tenho muitos.

- É mesmo? - Provoquei. - Me diga um!

- Er... - Gesticulou. - Tem... Tem o... Calma, eu vou chegar lá. - Mordeu o lábio, pensativo. - Eu sou bom em... - Coçou a nuca, prendendo o riso. - Sexo!

- Que resposta idiota! - Gargalhei com as mãos na boca para não acordar o Sr.Gray. - Acho que eu esperava mais de você.

- Qualquer coisa que eu respondesse soaria idiota. - Deu de ombros. - Não queria parecer metido.

 - Oohh... - Revirei os olhos. - A sua resposta fez você parecer muitooo modesto.

Edward virou o rosto e tive a impressão de que balbuciou um palavrão. Estava tão nervoso assim?

- E qual o seu talento? - Virou-se para mim cruzando os braços.

- Acho que não tenho. - Franzi o cenho.

- Não me enrola, você deve saber fazer alguma coisa legal.

- Bem... Na verdade... - Estreitei os olhos, arquitetando. - Sei fazer um “lance”.

- Me mostre. - Ficou mais interessado do que eu esperava.

- Você tem que prometer que não vai rir. - Falei sério.

- Está prometido.

- Vem comigo!

Saímos da sala sem fazer nenhum barulho. Ficamos parados no meio do corredor completamente vazio e a expressão de curiosidade de Edward era quase hilária.  

- Lembre-se de que não deve rir. - Pedi tirando o meu blazer e logo depois os sapatos e meias.

- Seu talento é tirar a roupa? - Ficou confuso. - Porque, se for... - Pigarreou. - Quem sou eu para condenar, por favor, continue.

- O quê? Não! - Joguei meu sapato nele. - Não é nada disso. Apenas observe.

Fiquei a uns 15 metros de distância de Edward e chacoalhei os braços, relaxando os músculos. Respirei fundo, então corri pegando impulso e os saltos carpados que se seguiram fluíram naturalmente. Minhas mãos e pés tocaram o solo quatro vezes, fazendo com que os meus cabelos esvoaçassem e a minha calcinha inevitavelmente aparecesse. A sensação de girar no ar anulou qualquer preocupação e o último salto, no qual não usei as mãos, diminuiu de vez a distância entre nós.

- Então? - Ofeguei, com os pés bem firmes no chão.

- Isso foi muito legal! - Aplaudiu sem fazer barulho. - Estou mesmo impressionado.

- Obrigada. - Peguei na barra da saia e fiz uma reverência.

- Como aprendeu?

- Quando criança, eu brincava sozinha, daí ficava saltando pelo jardim. Pelo visto ainda sou boa.

- Por que brincava sozinha?

- É melhor voltarmos para a sala. O Sr.Gray pode acordar. - Desconversei.

- Ele só acorda quando o alarme toca. - Olhou para seu relógio. - Já que fugimos da detenção, queria te mostrar uma coisa.

(...)

- Uau! - Murmurei chegando ao topo da torre do sino.

O lugar não era grande e as paredes estavam desgastadas por causa do tempo. Em cada uma das quatro paredes havia uma janela e através delas dava para ver todo o colégio. Os pátios, os jardins, o estacionamento e muito mais. O que eu sabia era que o sino havia sido aposentado há uns vinte anos, mas, pelo que vi, a enorme peça de cobre continuava intacta apesar de empoeirada.

- Esse é o lugar mais tranquilo de todo o Democracy. - Edward ficou perto de uma janela.

- Nunca estive aqui antes. - Juntei-me a ele. - É incrível!

Ficamos observando a paisagem em silêncio por bom tempo, então Edward murmurou uma pergunta interessante.

- E você? Onde me levaria?

- Para velejar! - Respondi imediatamente.

- Nossa... - Riu. - Você já tinha mesmo a resposta na ponta da língua.

- Pois é... - Ruborizei, arrependida por ter deixado tão claro que aquilo sempre foi uma fantasia minha.

- Velejar é mesmo incrível - Falou como se entendesse bastante do assunto. - Você veleja?

- Não. Nunca fiz isso. Não entendo praticamente nada sobre barcos, mas sempre desejei velejar.

- Não é assim tão difícil quanto parece. O que te impediu de realizar esse desejo?

- Sei lá... - Dei um meio sorriso. - Tem uma porção de coisas que nunca fiz.

- Tipo?

- Você não vai querer saber. - A conversa estava se tornando demasiadamente pessoal e eu não sabia como Edward reagiria às respostas.

- Insisto!

Inicialmente fiquei nervosa, mas logo percebi que não havia muito a perder.

- Nunca assisti uma partida de basquete, nunca fui ao cinema, nunca fiquei de recuperação, nunca... - Resolvi falar o último item bem rápido na esperança de ele não ouvir. - Nunca beijei, exceto por dois selinhos. Então? E você, o que nunca fez? - Mudei logo de assunto.

Edward ficou me encarando pensativo e sua expressão não era amistosa.

- Não. - Se chateou. - Não tem como eu acreditar nisso!

- Não estou pedido que acredite.

- Você saiu com uma porção de caras do colégio e nós transamos. Como espera que eu acredite que nunca beijou? É alguma piada? Não tem graça!

Baixei a cabeça sem argumentos. Enquanto Edward não soubesse quem eu era, jamais me entenderia. Pretendia lhe contar a verdade na Sexta, só que queria um pouco mais de tempo com ele antes que me enxergasse só como a “Isabella duas caras”.

- Aquele cara que te falei... - Foi difícil manter minha voz firme. - Ele tentou me beijar, mas não conseguiu.

- E por isso não procurou beijar mais ninguém? - Cedeu um pouco, nitidamente se esforçando para acreditar.

- Isso é pra ser feito com quem se gosta, estou errada?

Edward ficou um tempo calado, preso num conflito interior que se refletia em seus olhos.

- Que droga! - Bufou. - Intuição versus razão. Minha intuição me diz para confiar em você, mas, depois de tudo que fez, é...  - Aumentou o tom de voz. - Extremamente difícil! Por que Bella? Por que fez tudo aquilo comigo? Achou que seria finalmente aceita? - Fez uma breve pausa e quando voltou a falar estava mais ressentido do que chateado. - Se desde o início tivesse se mostrado como é agora, acho que eu teria... - Refreou-se no pior momento.

- Teria? - Sua aflição se tornou a minha.   

- As coisas teriam sido diferentes. - Fechou os olhos por dois segundos. - Só isso.

- Você também não era o mesmo.

Edward me encarou aceitando a inquestionável verdade.

- Às vezes tenho a impressão de que a vida está me pregando uma peça. - Encostou a testa na parede.


Edward PDV




Estava ficando louco tentando compreender por que queria tanto acreditar em Bella. A garota embaralhava meus pensamentos e, ainda assim, meu corpo reagia a ela intensamente. Por um tempo, achei que a atração havia acabado, mas estava apenas adormecida por causa da raiva, só que, agora, meus sentimentos estavam seguindo um curso diferente. A “Marie” que eu esperava encontrar estava mesmo presente na personalidade de Bella. A junção das duas pareceu criar uma terceira garota, uma terceira idéia de quem ela realmente podia ser. Mas, ao invés de isso simplificar a minha vida, só complicou, pois a vontade de desvendá-la por inteiro só não superava a vontade de continuar ao seu lado. Que tipo de masoquista eu tinha me tornado? “Burrice” agora era o meu nome do meio? Ridículo! Ridículo! Ridículo!

- O machucado na sua testa está doendo? - Bella sussurrou com receio.

- Estou bem. - Menti sem me mexer.

- Não precisa se fingir de forte. Ser atingido por uma lata deve doer pra caramba.

Boquiaberto, me virei para ela desconfiado.

- Ninguém, exceto a minha família, sabe que fui atingido por uma lata.

Imediatamente, Bella perdeu toda a cor da face. Seus lábios tremularam como se fosse falar, mas nenhum som saiu de sua boca.

- Eu quero uma resposta. - Exigi com seriedade. - Foi você quem mandou fazer aquilo comigo?

- Não! - Quase gritou. - Eu juro que não! Como pode...

- Como posso pensar isso de você? - Segurei-lhe o pulso com força. - Tem certeza que eu preciso explicar?

Bella fechou os olhos como se estivesse sofrendo, só que eu não sabia se era mero fingimento.

 - Água e óleo. - Abriu os olhos vagarosamente e desvencilhou-se. - Como você disse, somos água e óleo.

A alegação causou um impacto que eu não esperava. Senti-me mais do que frustrado, angustiado.

- Quem realmente é? Do que tem medo? - Estendi minha mão para tocar sua face, mas Bella deu um passo atrás, tirando de mim a esperança de uma resposta satisfatória.

- Tenho medo de você. - Sussurrou.

- Não vou feri-la.

- Faz isso até sem sentir. - Deu mais um passo atrás. - Só a sua existência é o suficiente para... - Balançou a cabeça reprimindo as palavras que eu ansiava. - Acabou! - Deu-me as costas para ir embora e me aborreci.

- Acabou nada! - Puxei-lhe pelo braço e a coloquei rudemente contra a parede. - O que você quer de mim? - Gritei irado. - Pare de me enlouquecer! - Soquei a parede perto de seu rosto e Bella sequer pestanejou. - Responda. A droga. Das perguntas! - Rosnei em seu ouvido perdendo o controle. - Você arruinou a minha vida e agora quer ferrar também com o meu juízo? - Apontei para minha cabeça que estava preste a explodir. - O que ganha com isso? Que jogo doentio é esse?

- Irei embora. - Sua voz se tornou fria como gelo.

- Espera mesmo que eu acredite em alguém que mente e manipula o tempo inteiro? - A fúria me dominou e quando percebi já estava com a mão em seu pescoço. Meu coração acelerou e tudo no mundo sumiu, exceto Bella. - Eu podia matá-la... - Com a respiração presa na garganta, Impulsivamente apertei seu pescoço. - Motivos é que não me faltam.

- Vá em frente - Disse com a voz fraca.

Nos olhos de Bella havia rendição e um estranho desejo de que eu cumprisse a ameaça. As mesmas íris misteriosas que me levaram ao inferno aplacaram, sem muito esforço, a ira dentro de mim, abrindo, assim, caminho para sentimentos confusos e contraditórios. Perdido e de olhos fechados, colei minha testa na dela e aos poucos fui soltando o seu pescoço. Não demorou a ofegarmos juntos, procurando ar em um espaço pequeno demais para tanto conflito irresoluto.

- Você terá suas respostas. - Afagou a minha nuca.

- Quando?

- Hoje.

Abri os olhos e me afastei lentamente. Conforme fazia isso, a mão de Bella deslizou da minha nunca, passou por meus ombros e deteve-se em meu peito.

- Você promete? - Lá estava eu novamente, estupidamente cativado por sua presença.

- Edward, eu juro!

Seus olhos ficaram marejados e eu quis cruzar os limites estabelecidos pelas dúvidas e simplesmente beijá-los. Porém, antes que eu cometesse esse doce erro, Bella se distanciou e atravessou a porta abandonando-me.

Debilmente, me arrastei de volta à sala de detenção e debrucei-me sobre os livros, mentalmente exausto. Bella permaneceu em seu canto e o Sr.Gray continuou dormindo. Os minutos que se seguiram foram vazios e silenciosos.    


Adam Lambert - Whataya Want From Me

Por favor, não desista,
Não vou te decepcionar
Fiquei confuso, preciso de um segundo para respirar
Só continue se aproximando
O que você quer de mim?
O que você quer de mim?

Pronto, é fácil de ver
Que, baby, você é linda
E não há nada de errado com você
Sou eu, sou estranho
Mas, obrigado por me amar
Porque você está fazendo isso perfeitamente

E pode ter havido um tempo
Quando eu teria deixado-a escapar
Eu não iria nem mesmo tentar, mas acho
Que você poderia salvar a minha vida

Apenas não desista,
Estou me esforçando
Por favor, não desista,
Não vou te decepcionar
Fiquei confundido, preciso de um segundo para respirar
Só continue se aproximando
O que você quer de mim?
O que você quer de mim?

Apenas não desista de mim
Eu não vou te decepcionar
Não, eu não vou deixar você triste

Então
Apenas não desista,
Estou me esforçando
Por favor, não desista,
Não vou te decepcionar
Fiquei confundido, preciso de um segundo para respirar
Só continue se aproximando
O que você quer de mim?




O alarme tocou nos liberando da detenção. Arrumei minhas coisas devagar e o Sr.Gray nos apressou. O segui rumo à saída, mas assim que ele atravessou a porta Bella me deteve bloqueando a passagem. Ela nada falou, apenas me estendeu uma carta. Peguei o papel sem tirar os olhos de seu rosto, no entanto o contato visual foi breve demais para eu compreender por que sua fisionomia tinha se transformado em um mero conjunto de linhas sem vida.

Bella foi embora sem olhar para trás, então desdobrei a carta e caiu no chão outro papel, ainda mais bem dobrado que o primeiro. Intrigado, peguei o papel do chão e comecei a ler a carta.

Querido Edward Anthony...

Eu já passei por situações terríveis, mas escrever essa carta é tão difícil que sinto como se meu coração fosse parar...

Voltei ao Democracy com um único objetivo e por ele eu mataria e morreria, e foi exatamente isso que aconteceu. Apaguei a “luz” dos nossos caminhos e ficamos perdidos na escuridão do nosso passado. O ódio que servia de combustível para a minha obsessão foi tão grande, que acabou morrendo do próprio excesso quando você confessou seus erros ao Filho da Democracia. Hoje, analisando bem, vejo que tudo que falou naquela noite foi de coração. Eu sabia que estava sofrendo e desejava isso mais que tudo. Acreditei estar fazendo justiça, mas essa “justiça” falhou de todas as formas possíveis. Em alguns momentos era como se nem fosse eu mesma... Acredite, hoje não sou uma pessoa mais completa ou mais feliz, pelo contrário. Queria ter percebido antes que, se tivesse refreado a mágoa e tirado um tempo para compreender como você se sentia por dentro, talvez pudéssemos ter ajudado um ao outro.

Espero que essa carta e essa ficha te ajudem a encontrar absolvição e, finalmente, paz.

Sinceros lamentos de quem, agora, eu realmente sou...

Isabella Duas Caras.

Boquiaberto e com as mãos tremulas, desdobrei a ficha e, ao ver a foto da garota com o rosto cheio cicatrizes, senti a adrenalina de vários ataques cardíacos.

Era ela! Era Isabella!

Fechei os olhos e imediatamente as lembranças em flashes invadiram minha mente, ligando um acontecimento a outro. De repente, cada frase, cada briga e provocação começaram a fazer sentido. A mesma garotinha que eu sentia como se me seguisse era a mesma mulher que arrancou de mim tudo que eu julgava ser importante.

Voltei meu olhar para a foto e, novamente, me senti culpado por tudo que lhe fiz. O lado direito do rosto de Isabella era o mesmo que eu acabara de ver. No entanto, toda a sua bochecha esquerda, assim como o queixo e pescoço eram uma confusão de cicatrizes, as quais só me faziam lembrar que houve muitas outras espalhadas por seu corpo. E, naquele momento, realmente senti como se merecesse sua vingança.

Como eu podia ousar igualar minha dor à dela? Quando a perseguia, ela era só uma criança assustada e depois, quando transamos, era uma garota de 15 anos solitária e ingênua. Ao concluir esse pensamento, minha mente remeteu-me ao dia em que transamos na sala do diretor. Uma frase em particular abriu meus olhos para outra questão.

Agora você me quer, não é?

Ela devia estar se referindo à forma fria com que lhe tirei a virgindade. Depois disso, só precisei de um segundo para ligar a frase a um trecho de suas cartas.

Minha história com esse rapaz é bastante complicada. Sempre nutri um sentimento muito forte por ele, algo inominável. Foi o primeiro a me tocar internamente e externamente, por isso meus laços com ele vão além do entendimento de muita gente. 

Ainda em choque, finalmente me dei conta de que eu era aquele rapaz. Era de mim que Isabella gostava!

- Como não percebi isso? Droga! - Larguei minhas coisas e corri o mais rápido que pude.

***

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8 comentários:

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